terça-feira, 25 de junho de 2013

Cinema: Superman, o Homem de aço.



   Superman, o homem de aço:  O que a trilha 

sonora do novo filme pode nos dizer sobre ele?







O que a trilha sonora de Hans Zimmer pode nos dizer sobre “Superman, o homem de aço”?
 Por   Zaius Primati

           Neste domingo, 23 de junho, eu estava na Multiverso Comic Con, em Porto Alegre. Um dos painéis era sobre o novo filme do Super Homem, que estreia no Brasil  no próximo dia 13 de Julho.  Após o debate entre os convidados, foi aberto um espaço para perguntas.

         Lógico que, como bom "Old School" nerd que sou, perguntei o que eles achavam da ausência da música John Williams no novo filme. Para minha decepção, praticamente nenhum dos presentes levantou qualquer objeção a esse fato. Perguntados sobre se havia alguém presente que tinha assistido o filme original de Richard Donner no cinema, apenas duas mãos se ergueram. A minha, que assisti o filme com 14 anos de idade e a de Sidney Gusman, da Maurício de Souza Produções, que o assistiu aos 12 anos de idade. Além de mim, apenas ele parecia se lembrar do quão épica era, ou melhor, é, a trilha sonora de John Williams para o super-herói mais famoso das histórias em quadrinhos da DC. Fiquei triste. Senti como se um grande amigo tivesse sido esquecido em seu leito de morte, como se o próprio Kal-El tivesse morrido nas mãos de Apocalipse e todos tivessem superado isso, seguido com suas vidas, e sua estátua, agora, nada mais fosse do que um caríssimo banheiro para pombos, abandonado em algum parque de Metrópolis.

      " Eu estou cansado de ouvir John Williams", disse meu jovem interlocutor. "Eu estou cansado de ter John Williams me dizendo o que sentir a cada cena de um filme", prosseguiu ele.  Eu, não muito gentilmente, confesso, lembrei-o de que eu teria apreciado muito a opinião dele, se essa realmente fosse a sua opinião, e não a de Terry Gillian, que usou exatamente AS MESMAS PALAVRAS ao se referir a John Williams, em dezembro de 2011 (como fã de Williams eu jamais esqueceria isso). Acrescentei que era coerente.  Afinal, se Zack Snyder queria um Superman menos poderoso, mais realista, nada mais apropriado do que uma música menos poderosa.

             Fui embora do evento pensando no que ouvi. Não tenho dúvidas de que será um belo filme, independente da música. Muitos fãs não estão nem aí. Basta qualquer coisa medianamente audível. Ou nem isso. Há até quem sugerisse que um heavy metal daria conta (Higway to Hell cairia como uma luva, sim... para um filme do LOBO). Mas algo naquela trilha me incomodava.

          Então resolvi ouvi-la, despido de meus preconceitos e buscando uma quase impossível avaliação isenta.  Pedi a um maestro amigo meu um artigo sobre isso, mas, como o cara é ocupadíssimo e nunca lê seu FACEBOOK, vocês terão que aceitar a palavra de um trompetista amador que parou na lição número 76 do método Bona de solfejo.

         Música vem do grego, onde significa “a arte ou técnica das musas”. Então, de certo modo, é impossível que alguém não sinta nada ao ouvir um tema musical. Minha filha de cinco anos fica apavorada quando ouve músicas com um tom sinistro ou ameaçador, mesmo sem ter visto os filmes de onde essas músicas vieram. E é para isso que elas servem. Assista um filme iraniano onde só se ouve o vento no microfone, para ver como é bom...

        Dito isto, o que a música dos dois filmes , o "Superman -The Movie" de Donner  e o "Man of  Steel de Snyder", pode nos dizer sobre ambos?

        A poderosa marcha de John Williams é esmagadora e já chega arrebentando:  um ser  com poderes divinos desceu das estrelas e fez da Terra seu lar adotivo, lar que defenderá contra todas as ameaças. Seu tema evoca vividamente o vôo. Como lembrou Sidney Gusman, “você acreditará que homem pode voar”, que é também o slogan da propaganda do filme de 1978.

       A trilha de Zimmer evoca estranheza, mundos alienígenas, emoções violentas, batalhas e por aí vai. Esse clima é criado com o uso de uma percussão que lembra antigos tambores de guerra celtas e escoceses, as notas mais graves do piano e os sons eletrônicos minimalistas que Zimmer tanto ama, como aquele irritante e insano ruído rascante que ele usou para representar o Coringa em “O cavaleiro das trevas”. Afinal, parafraseando Sidney Gusman “Vai ter porrada, nerdaiada!”. E não podia ser diferente. Afinal, Zod é o vilão do filme.

       Então, o que é que essas duas trilhas têm em comum que possa representar o mais poderoso herói da DC comics em toda (ou quase toda, como querem alguns) a sua glória?

         Em recente artigo de Fábio Scrivano  para a Revista da Cultura, Mark Richards, PhD em teoria musical, explica o motivo do tema de Williams ser tão icônico. “O tema é uma marcha, o que sugere força. E a melodia emprega grandes intervalos ascendentes entre as notas, em particular aquele chamado de quinta perfeita, usado para denotar heroísmo, bem como os trompetes da orquestração ". O maestro também destaca o fato da música crescer gradativamente, criando um senso de expectativa, como se a plateia estivesse prestes a presenciar algo extraordinário. E acrescento: é um tema que você sai assoviando do cinema. Tente assoviar o tema de Michael Kamen para “X-Men, o filme”. Conseguiu?  Não? Entendeu qual é a sensação? É por aí.

         Mas, e quanto a “O Homem de aço?”. Desconsiderei os temas de batalha e fui direto para  “What are you going to do when you are not saving the world?”, que sintetiza o espírito do filme. Eu, francamente, não estava interessado em saber, pela música, qual é a sensação de viver em Krypton ou como é trocar socos com o general Zod. Tudo o que eu queria saber é: quem é Kal El? O que faz dele quem ele realmente é? Como ele se sentiria vivendo num mundo de criaturas frágeis como bolhas de sabão e, ainda assim, tentando ajudar e ser aceito por elas, enfim, tentando encontrar seu lugar no mundo, como todos nós.

O tema começa com um piano bastante sutil. Evoca solidão, melancolia, dúvida, perda. Lembra demais aquelas cenas dramáticas sem diálogos, que um outro compositor, Michael Giacchino, sabe ilustrar tão bem com seu piano, e arrancar lágrimas até dos mais frios entre os mortais. Então, a música começa a embalar, com uma percussão que lembra as antigas cadências britânicas de que já falei. É um som tenso, violento. Obviamente, está se referindo aos obstáculos da jornada do herói.
    
         Mas, quando você pensa que a trilha vai descambar para uma música puramente guerreira, acordes de cordas eletrizantes e poderosos metais se insinuam, num crescente, se elevando acima dos tambores da guerra, subindo, cada vez mais, rumo aos céus, rumo à luz, rumo ao sol, fonte dos poderes do herói. Para o alto, e avante! 

         E não me venham com esse papo de que “é um filme mais sombrio, para um público mais adulto”. Se a luz não fosse a essência do herói, a capa de “Os melhores do mundo” não teria Superman cercado de pombos ao amanhecer enquanto Batman está rodeado por morcegos e pela escuridão. E é essa luz, em forma de música, que ouvimos, elevando-se acima da escuridão e da violência da guerra. É a esperança.

      Então, quem é Kal El afinal de contas?

      No filme de 78 o tema de John Williams não deixa dúvida: o destino do último filho de Krypton já estava traçado por Jor El, seu pai biológico. Apesar de todas as suas dúvidas e angústias, Clark Kent desaparece do filme assim que ele encontra as memórias de seu pai, na fortaleza da solidão. O Clark que trabalha no planeta diário é só uma casca para Kal El, quase um alívio cômico. Superman já está nos céus. Cabe a ele descer à terra e salvar os mortais, mesmo que tenha que compartilhar as nossas dores e o nosso sofrimento.

      Em “O homem de aço”, a música de Zimmer parece evocar uma história diferente: Clark não desaparece após deixar a fazenda de sua infância. Ele, como já foi dito por parte da crítica, é “o relutante defensor de nosso planeta”.  Ele não está nos céus. Ele caminha entre nós, mas não é um de nós. E o tema de Zimmer demonstra isso, de modo claro.  

Se o Superman de Williams está descendo à Terra, o de Zimmer, está decolando, se elevando acima de suas dúvidas, suas perdas sua tristeza, rumo à luz e a compreensão, rumo à esperança e,  levando com ele, as esperanças de sua irmã adotiva, a humanidade. Sim, é uma música minimalista, muito menos complexa que a de John Williams. Em termos de evocação heróica e tonalidade épica, apanha até do comparativamente modesto tema que Alan Silvestri compôs para “Capitão América”. Mas transpira humanidade por todos os lados.

Se Williams nos mostrou com música como é o filho de deuses descendo das estrelas, Zimmer nos mostra o que é o filho de dois fazendeiros do Kansas vencendo a si mesmo e ascendendo ao infinito. Perto do final da música, os próprios anjos parecem saudar, com um glorioso e apoteótico coral, o homem que se tornou herói, o mortal que se tornou divino.  Ouvi algumas versões dessa música em que, logo após o ápice do tema, há um anticlímax, digamos, meio frustrante. Apenas para usar uma metáfora inocente (pode haver crianças lendo isso. Li minha primeira resenha aos oito anos...), é como se você estivesse comendo sua torta favorita e, perto da melhor parte do recheio, alguém vem e leva a fatia que você queria. Mas, se isso servir a algum propósito da trama, paciência.

Posso me sentir o maior traidor dizendo isso, mas estou pronto para o novo tema. Sempre haverá um lugar para o extraordinário tema de John Williams em nossos corações. Ele está lá e fez por merecer. Ele é eterno. Mas Zimmer parece ter aprendido que ele jamais poderia “peitar” uma lenda e consegue se safar do dilema indo em outra direção.


E quanto a Kal El / Clark Kent, ele pode ser filho de seres divinos, pode ser mais rápido que uma bala, mais forte que uma locomotiva, invulnerável, indestrutível. Mas nada disso jamais será maior que o amor que ele recebeu de um humilde casal de fazendeiros do Kansas. E é nesse amor, e na compaixão que ele gerou, que residem seus maiores poderes.



Ouça abaixo e compare:

O original...




...E a trilha sonora do novo filme:

http://www.youtube.com/watch?v=y2mb6NXYGm8


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